No grito das mulheres coloradas o Inter se eleva
No último sábado, como medida disciplinar direcionada ao Internacional, somente mulheres, crianças e pessoas com deficiência foram permitidas a comparecer no Beira-Rio durante a partida contra o Ypiranga.
Quem convive com o mundo do futebol provavelmente já percebeu a presença feminina, esta realidade mudou muito ao longo dos anos, isso é notável na participação nas mídias esportivas, na organização do futebol feminino e principalmente na vivencia e atuação como torcedoras, isso é uma mudança positiva que o nosso tempo proporcionou, pois antigamente as mulheres, de forma geral, participavam das torcidas nos estádios como acompanhantes, com roupas quase camufladas e mesmo assim se tornavam alvo de ações que devem ficar datadas em um passado nada glorioso.
O Internacional recebeu uma punição justa, talvez até modesta, em decorrência dos eventos perturbadores ocorridos no Beira-Rio durante a última edição do Gauchão contra o Caxias. Entre os incidentes, destaca-se o lamentável episódio em que um torcedor invadiu o campo para agredir adversários, segurando sua própria filha no colo, uma cena que, por si só, carrega múltiplas transgressões e ganhou destaque internacional. Como resultado, após jogar sem a presença de público na estreia do Estadual, o Internacional enfrentou o Ypiranga com a condição de permitir a presença apenas de crianças, mulheres e pessoas com deficiência nas arquibancadas.
No caso do Internacional, a punição, inicialmente motivada pela intenção educativa, desdobrou-se em um evento verdadeiramente marcante. As mulheres, que já vinham há algum tempo se desvinculando do constrangimento de frequentar o Beira-Rio e outros estádios brasileiros, tornaram-se protagonistas absolutas desta vez - nas arquibancadas, no pré-jogo e nas ruas. As imagens da caminhada das mulheres em direção ao estádio, assumindo o comando da Popular e sendo as únicas responsáveis pelo inegociável apoio atrás do gol do placar eletrônico, tornam-se instantaneamente míticas na história do clube. "Eu nunca me esquecerei...", gritavam a plenos pulmões. Um canto que certamente ficará na memória de todos os colorados.
Assistir o ritmo do jogo com o som do coro exclusivamente feminino é reviver uma conexão que ajudou o Inter ser o Inter, vamos a explicação.
Como todo clube de massa, o Internacional conta hoje com torcedores em todas as classes sociais. No entanto, é inegável que o clube tem raízes populares, refletindo-se desde a sua fundação. Sua história é marcada pela diversidade, renovação e uma clara afronta aos padrões estabelecidos. Embora algumas direções ao longo do tempo não tenham priorizado assumir essa representatividade, a essência persistiu e permaneceu evidente - os alicerces do Beira-Rio conhecem bem os tijolos que o ergueram e sustentam.
O Internacional, que teve sua primeira sócia em 1918, destaca-se hoje por ter o maior quadro social feminino do país. O que ocorreu no último sábado, um 27 de fevereiro tingido de 4 de abril, foi um eco desse coloradismo essencial que se projeta como reflexo ao longo das eras. Foi a reverberação da própria história, amplificada pela voz das mulheres coloradas.
Ricardo Niquetti - Professor e colunista estrangeiro
*A coluna não representa o pensamento da Comunidade FM.
- Autor: Professor Ricardo Niquetti*
- Imagens: Bruno Ravazzolli